domingo, 27 de abril de 2014

CAMINHANDO SOBRE AS ÁGUAS DO MAR


Era Domingo e, finalmente, poderia ter algum tempo livre. Por ali, o sol nascia sempre demasiado cedo. A luz cálida e intensa invadiu o quarto, ferindo-me os olhos ainda ensonados pela ressaca da noite. Os lençóis colavam-se ao corpo, teimosamente, num desconforto que eu insistia em prolongar, somente por preguiça. Por baixo do braço entorpecido, que me cobria o rosto, tentei vislumbrar os enormes algarismos fluorescentes do antigo despertador; que me vigiava do alto de uma cómoda gasta e escura, durante todas as minhas santas horas de sono, num enervante e insuportável tic-tac. Eram seis da manhã, enrolei-me, ainda mais, nos lençóis transpirados e quentes, e deixei-me dormitar numa espécie de cegueira branca.

No dia anterior, tinha terminado a leitura do romance “Ensaio Sobre a Cegueira”. O livro fala nos que são cegos porque não querem ver e nos que, não sendo, cegam porque não têm ninguém para os ver. Pensei em ti, naquilo que poderias estar a fazer, no que poderíamos fazer juntos caso não estivesses tão longe, pensei nas nossas zangas sem sentido, nos nossos silêncios, pensei na cegueira que nos invade, por vezes, quando estamos tão perto, naquilo que só conseguimos ver quando nos afastamos, e pensei que é nestes momentos que realmente sei de quem gosto.

Sentia comichão nas pálpebras, provocada pela camisa preta que coloquei sobre os olhos para fingir a penumbra ou, talvez, para não enfrentar o dia radioso que nascia, tão vazio pela tua ausência. Foi quando me bateu a saudade e soube que não poderia continuar mais naquela indolência demasiado susceptível aos pensamentos.

Levantei-me num ímpeto repentino e resolvi ir viajar, sozinho, pelo interior. Não verifiquei, sequer, se o jeep tinha ferramenta ou pneu suplente em condições. Perdoa-se a imprudência pela ousadia pois não era aquele o momento para estar com preocupações mecânicas. A perspectiva do pasmo domingueiro, fazia perder todos os receios de me aventurar no interior duma ilha sempre desconhecida para mim. Geralmente, nestas alturas, o lema era o “logo se vê”.

Ao contrário do tempo de seca, a ilha tornava-se mais bonita devido às chuvas recentes. Uma erva rasteirinha cobria o chão infértil, dando um aspecto verde e suave à paisagem. As árvores, próprias dali e das quais, ainda hoje, não sei o nome, eram raras e escassas, contrariamente aos cactos e às pedras que emergiam isoladas no solo. A estrada, toda em cubos de pedra basáltica, serpenteava estreita ao longo dos montes, por vezes íngremes. Era preciso ter algum cuidado, frequentemente as pedras desagregavam-se das escarpas alojando-se no meio do caminho, numa atitude de arrogante provocação. Por vezes, alguém se lembrava de as tirar de lá. Os vales, onde afluíam as linhas de água vindas das montanhas, eram as dádivas de Deus naquela terra. Ali, a paisagem tornava-se esplendorosa, com coqueiros, bananeiras e outras culturas que a terra húmida das chuvas permitia e que as gentes locais aproveitavam para a sua parca subsistência.

Cheguei à Cidade Velha, antiga capital da ilha, e que, agora, não passa de uma pequena povoação, entalada entre a encosta e o mar e onde se entra, apenas, por uma estrada sinuosa e íngreme. As ruínas dos primeiros edifícios coloniais davam lugar a pequenas construções de blocos sem cor, á excepção da sé catedral que se encontrava em reconstrução, e único sinal de movimento nos dias úteis da semana. Mais acima, no alto da encosta, os canhões corroídos da velha fortaleza vigiavam o horizonte, como se aguardassem, ainda, estoicamente, as investidas do pirata Francis Drake.

Não se via vivalma. O silêncio era, apenas, quebrado pelo rodar dos pneus sobre o empedrado da rua estreita que dava entrada á praça da cidade, e por alguns sons vindos do interior das casas, provocados por alguma azáfama doméstica. As portas e janelas abriam-se, despudoradamente, franqueando o intenso movimento de insectos; atraídos pelos resíduos de carne crua acabada de talhar, e destinada á sempre comedida refeição domingueira. O pelourinho da praça, já bastante desgastado pela proximidade do mar, mantinha-se só, tentando, talvez, esquecer o arrastar das grilhetas e o cheiro salpicado de sangue, dos escravos que, outrora, agonizaram a seus pés.

O mar estava calmo, provocando um ondular de espuma branca que se sumia suavemente por entre o calhau rolado e escuro da pequena praia. Uma aragem quente e leve, vinda do outro lado do mundo, passou por entre as folhas longuilínias das palmeiras, e fez-me pensar novamente em ti. Já não o fazia desde o inicio da viagem, talvez porque a magnitude da paisagem me tivesse absorvido de tal forma que o pensamento bloqueou, fazendo-me esquecer tudo quanto não fosse permitido ao olhar.

Olhei, novamente, o mar calmo e avistei tão longe que a linha do horizonte já não era recta mas, sim, redonda como a linha da terra. Imaginei a tua pele branca e suave, as carícias perdidas pela distância e os beijos que te poderia dar, meigamente, por entre os cabelos soltos; enquanto dormitavas encolhida, ao canto do sofá, e expondo, subtilmente, a curva dos seios por entre o decote da blusa fatigada pelo longo dia. Lembrei-me dos nossos longos passeios a pé, de mãos dadas através da noite, dando risos cúmplices sem motivo ou dizendo coisas banais e sem sentido.

Senti uma vontade tresloucada de te tocar, atravessei, descalço, as pedras molhadas, galguei a brandura das ondas e caminhei, ao teu encontro, sobre as águas do mar. Não sei a distância que percorri para te alcançar, o sol alto do fim da manhã bateu-me de chofre e soltou-me do torpor que a tua presença imaginária me provocou.

Sentado no murete que limitava a praia, resguardei-me numa das erráticas e modestas sombras originadas pela copa dos coqueiros, mas, depressa, o sol já abrasador me fez procurar outro local. Olhei em redor e, ali perto, avistei um velho telheiro circular; constituído por uns esguios troncos de madeira que suportavam, debilmente, uma cobertura de capim já ressequido, que os ventos mais fortes se iam encarregando de desfazer ao longo do tempo e que me poderia abrigar mais confortavelmente.

Continuava a não se ver vivalma e uns imperceptíveis cânticos eucarísticos, vindos dali perto, misturavam-se com o rumorejar das palmeiras e dos coqueiros. Lembrei-me que era Domingo, e que, certamente, a maioria dos habitantes da terra estariam dentro da igreja a assistir á missa. A sombra do pequeno abrigo aconchegava-me os pensamentos e, com as mãos atrás da nuca, estendido sobre as pedras da praia, tentei concentrar-me em toda aquela mistura de sons que envolviam o local; talvez, e mais uma vez, para esquecer a tua ausência. Foi quando pressenti alguém que caminhava ao ritmo de passadas largas e lentas, provocando um estranho barulho de pedra triturada.

Rodei a cabeça sobre a concha das mãos. Um vulto, que imaginei ter á vontade dois metros e tal de altura, aproximou-se desastradamente, batendo com o avantajado corpo num dos pilares do telheiro e, quase, fazendo ruir o já periclitante e frágil abrigo. Uma nuvem de pó e resíduos de capim podre, caiu-me sobre os olhos, cegando-me momentaneamente. Quando recuperei a visão, e ainda meio entontecido, vi uma enorme mulher negra perto de mim, sentada sobre um tosco banco de madeira carcomida.

         Com um arfar pesado e muito pausadamente, retirou um coco de dentro de um alguidar, que tinha colocado anteriormente a seu lado. De seguida, com uma pequena catana aguçada e num gesto único, que só uma destreza criada ao longo de muitos anos de prática permitiria, abriu um orifício na base do fruto ainda verde, estendendo-o com um dos seus longos braços e, olhando, finalmente, na minha direcção:

-Toma branquinho, mata-te a sede e alivia-te a saudade!

Mal refeito pela surpresa, sentei-me de pernas cruzadas, com os cotovelos sobre os joelhos, e, sem uma única palavra, bebi deliciosamente o refrescante suco que golfava do interior da polpa daquele fruto tropical. Com dois gestos cruzados, boçais até para quem pudesse observar, mas naquela altura isso nem sequer me preocupou, limpei os cantos da boca às costas das mãos, e após um extasiado agradecimento:

- Porque acha que estou com saudades?

-Não acho sente-se. Tudo á tua volta transpira saudade! Respondeu firmemente.

- Senão – acrescentou - que estarias aqui a fazer, olhando com esse ar melancólico o outro lado do mar?

- Provavelmente tem razão! Retorqui consentido, como quem está pouco interessado do assunto e não quer desenvolver demasiado a conversa.

Olhei mais atentamente aquele espécimen. Era, de facto, enorme! Vestia saia preta e uma blusa, já gasta de tanto uso, também escura mas que não me recordo exactamente da cor. O seu corpo volumoso e mole, parecia querer fugir por entre as pregas da roupa; que se notava ser feita por medida mas, mesmo assim, demasiado justa. Enrolado á cintura e á volta da cabeça usava uns “panu di terra”(*) de padrões avermelhados, o que lhe dava um toque de cor e o aspecto típico das gentes da ilha. O seu rosto largo resplandecia, sobre a atmosfera, a cor bronze da pele. Dos seus olhos, de um verde fluorescente, nunca mais me esquecerei. Eram eles que transmitiam vida aquela grande massa de carne, irradiando um sentimento de bonomia e felicidade, ao mesmo tempo. No entanto, contraditoriamente, e por vezes também, uma profunda tristeza invadia-lhe o olhar, como se algo de muito trágico a perseguisse ao longo da sua vida.

Um embaraçante silêncio foi-se estabelecendo entre nós, que quanto mais se prolongava mais difícil se tornava encontrar tema para reinício de conversa. Ganhei coragem e de maneira a fugir ao assunto anterior, perguntei:

-Porque não está na igreja como todas as outras pessoas?

-Cortei relação com Deus há muito tempo!

Respondeu quase sem me deixar acabar a pergunta.

A forma seca e dura como foi dada a resposta deixou-me paralisado e sem reacção para lhe perguntar mais o que quer que fosse. Mas, após mais alguns momentos de silêncio, ela retomou a conversa e disse-me que não me iria dizer o seu nome verdadeiro porque o achava demasiado feio mas que toda a gente lhe chamava Giga! Sorri para dentro disfarçadamente. Pensei, obviamente, como todos pensariam, que a alcunha tinha tudo a ver com o seu tamanho e não fiz qualquer comentário.

Contou-me que era da ilha do Fogo e que vivia naquela povoação, vendendo cocos na praia, já há muitos anos. Disse-lhe que nunca tinha ido à ilha do Fogo mas que já a tinha visto algumas vezes quando atravessava a serra da Malagueta, em viagem para o Tarrafal. Falámos do enigma que aquele pedaço de terra vulcânica encerra, e porque é que, umas vezes se conseguia ver a ilha e outras não. Parecia esconder-se no fundo do mar, emergindo subitamente, tentando respirar as nuvens e esmagando-nos com a sua imponência; qual gigante adamastor. Ainda hoje, quando penso nisso, algo me inquieta e intriga.

Giga concordava com tudo isto e, já mais à vontade um com o outro, fiquei tentado a voltar à questão do seu relacionamento com Deus. O assunto tinha ficado no ar. Ela apercebeu-se dos meus pensamentos e, sentindo-se em obrigação comigo desvendou mais um pouco a sua história.

Nasceu e viveu na ilha do Fogo até aos seus vinte e poucos anos, onde casou e teve três filhos gémeos. Sempre levara uma vida dura e humilde pois a terra nada lhes dava a não ser pó e lava. No entanto, tinha tido sorte pois o marido era um homem bom e trabalhador, gostava muito dela e dos filhos, o que lhes permitia viverem felizes. Um dia um terrível acidente aconteceu, levando os seus três filhos ainda pequenos. Não me contou como se deu tal tragédia, pois, nesta parte da história, a pausada voz travou-se de emoção e as lágrimas começaram a correr pelo bronze das faces, ofuscando-lhe o cristalino dos olhos.

O sol deixou de brilhar. Uma nuvem negra atravessou-se entre o céu e a terra, transformando a alvura do dia num quadro penoso e taciturno. Os cânticos deixaram de se ouvir, o silêncio instalou-se mais uma vez e, após uma longa pausa, continuou, já mais recomposta. Sempre fora crente em Deus, tentando levar uma vida de acordo com os mandamentos do catolicismo, frequentando a igreja quase todas as semanas, juntamente com o marido e os filhos. Aquele infortúnio destroçara-lhe, de um momento para o outro, as crenças de uma vida inteira, mas, mesmo assim, no meio da dor, ainda queria acreditar que o que o tinha acontecido poderia, por ventura, fazer algum sentido. Quando o padre da freguesia apareceu em casa para lhe enterrar os inocentes, a primeira coisa que perguntou foi:

-Porquê Padre? Porquê?

Previsivelmente, o padre respondeu como responderia qualquer outro, convicto da sua fé:

- Foi Deus que os levou minha filha.

-Mas porque razão Padre, porque fez ele tal coisa?

Voltou ela a perguntar, talvez ingenuamente, à espera que a resposta lhe pudesse suavizar aquele terrível sofrimento; respondendo o padre mais uma vez:

-Eles eram uns anjinhos, minha filha, e o melhor sítio para os anjinhos é no céu e não na terra.

Giga disse que cegou subitamente e que não sabia o que tinha acontecido depois. Quando voltou à razão, o padre estava entrevado e ela dentro de uma cela. Esteve presa durante dez anos e nunca mais voltou à sua ilha. Quando saiu em liberdade ficou-se por ali, pedinchando pelas ruas sujas da cidade e, mais tarde, fazendo pequenos trabalhos de limpeza para os estrangeiros da cidade.

Pensei na reacção de Giga e consegui entender aquele acto tresloucado. Como poderia alguém decidir entre mãe e filhos? Com que direito se poderia separar uma mãe de seus filhos, com o simples critério de que estariam melhor noutro lado? Que raio de Deus poderia fazer sofrer tanto alguém que sempre lhe foi tão devota?

Foi nestas interrogações que voltei á realidade e voltei a encarar aquela mulher, agora já com aquele seu ar bonacheirão, tentando esquecer a tristeza. O dia voltou a brilhar, abafado e ardente. Com o suor a fluir por todos os poros do meu corpo, retomei a conversa:

-E porque não voltou para a ilha do Fogo? Tinha lá o seu marido. Poderia reconstituir família!

-Não tive coragem, a vergonha e o remorso pelo que aconteceu nunca mais me largaram. O meu marido ainda fez algumas tentativas para me fazer regressar, mas perante a minha teimosia acabou por desistir e fomos perdendo o contacto. Penso que nunca deixou de me amar – disse com um ar resignado.

-E não sente saudades? Com certeza que continua a ter por lá família e amigos. Foi lá que nasceu, é lá a sua terra. E além do mais, ainda tem lá quem a ama!

-É claro que sinto, mas a saudade não é necessariamente um sentimento triste, desde que saibamos, sempre, onde é o nosso lugar!

O tema da saudade tinha voltado à baila, mas, desta vez, parecia não me incomodar tanto. Talvez porque, entre nós, se tenha gerado uma certa cumplicidade, uma certa sensação de solidariedade. Afinal, agora, a saudade era um sentimento comum a ambos.

-Mas o nosso lugar não é onde nos sentimos bem? – prossegui intrigado.

-Nem por isso! A maior parte de nós vive fora do seu lugar, apesar de levar uma boa vida. Podes possuir o que quiseres ou quem quiseres, mas se não souberes que há um lugar onde podes sempre voltar, onde tens alguém que te ama e a quem amas de verdade, tudo será aparente e falso.

E continuou muito certa do que dizia – Tu, branquinho, parece que ainda não descobriste esse lugar e, por isso, a tua saudade é triste. Pessoas como tu viverão eternamente numa constante inquietude, querendo estar sempre no lugar onde não estão e espalhando à sua volta toda a melancolia do seu ser.

Engoli em seco e nem sequer me atrevi a ripostar! Giga ergueu toda a magnitude do seu corpo, o céu e o mar passaram de azul a verde pelo simples reflexo do seu olhar, colocou o alguidar de cocos sobre a cabeça e afastou-se, serenamente, com os seus passos largos e lentos. Ainda a ouvi dizer, para além do chiar das pedras: - Adeus branquinho, até mais ver!

As ondas do mar derramaram, sobre a praia, uma fresca maresia que entrou pelo telheiro adentro, fazendo amainar a dureza sufocante do meio-dia. Dois miúdos aproximaram-se vestindo, ambos, uns pequenos fatos engelhados onde se destacavam, sobre as golas do casaco, os colarinhos claros da camisa demasiado grande e manchada. As calças, muito curtas, destapavam os tornozelos pretos e sem meias, onde encaixavam os sapatos de lustre barato e desajustados ao tamanho do pé. O cheiro a naftalina sobrepunha-se ao odor das peles negras e notava-se que eram roupas guardadas no amarrotado das gavetas, apenas para serem usadas em ocasiões mais solenes. Os seus olhos eram vivos e curiosos, deixando transparecer a humildade própria daquela gente. Pareciam gémeos, imaginei os filhos de Giga e pensei que Deus, felizmente, ainda não tinha reparado neles. Provavelmente, para alguns, isto poderia ser uma chocante heresia mas, ao lembrar-me daquela mulher, tal coisa não me preocupou minimamente. Ouviam-se falas cada vez mais perto, os miúdos continuavam a fitar-me sem qualquer gesto, percebi que a missa tinha acabado, que a vida regressava ao lugar, e que estava na hora de eu ir andando.

Entre a saída dali e a entrada na estrada principal que dá acesso à Cidade da Praia, não me lembro praticamente de nada, apesar de aquele percurso ainda ser longo. Foi um espaço em branco que ficou, como se tivesse ligado o piloto automático e me deixasse dormir. Quando dei por mim, já os prédios mais altos da capital se viam ao longe. O vento, vindo da cidade, trazia o cheiro da terra seca, contaminada de cimento e escória subjugada aos interesses do progresso. A planura ocre da paisagem enchia-se de lixo esvoaçante que acabava suspenso nas hastes aguçadas dos arbustos e dos cactos. Uma nuvem de poeira, branca e fina, espalhava-se sobre algumas pequenas construções pardacentas, fazendo antever a entrada na cidade e senti uma vontade imensa de chegar.

Pela janela ampla da sala, a sul, avistavam-se os bairros pobres e periféricos da cidade. Mais para oeste, por entre os telhados dos prédios contíguos, podia-se ver parte da baía com o porto mais ao fundo, por onde circulavam os navios, fatigados das extensas viagens através do oceano. Sentei-me no aconchego do ar condicionado e fechei os olhos. Recordei-me de Giga. Imaginei aquele enorme corpanzil de mulher amargurada a caminhar sobre as águas do mar, em direcção à ilha do Fogo. Finalmente, ao fim de muitos anos alimentando a saudade, regressava ao seu lugar, ao encontro do marido que ainda a amava e para juntos dos filhos que jaziam sob as lavas do vulcão.

Pensei em ti e senti o teu corpo aconchegado ao meu. Lembrei-me que em breve iríamos estar juntos. Sorri sozinho. Finalmente sabia onde era o meu lugar.

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